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Resenha: Miopia em marketing PRÓLOGO Theodore Levitt nasceu na Alemanha no primeiro quartil do século passado e faleceu no principio do corrente nos Estados Unidos seu país de adoção. Economista, mas amplamente conhecido por seus trabalhos na área de marketing, principalmente após a publicação do artigo objeto desta resenha na Harvard Business Review - HBA em 1960, periódico acadêmico do qual foi editor, além de professor emérito da instituição de mesmo nome. A partir de 1983, notabilizou-se também por empregar pela primeira vez o termo globalização, ao referir-se a uma abordagem mais ampla para os propósitos de uma organização, qual seja a de criar e cativar consumidores globalmente, ao invés de focalizar exclusivamente a obtenção e manutenção de lucros locais. O presente artigo de Levitt é citado com freqüência por diversos autores, inclusive por Peter Drucker, um dos maiores pensadores da Administração do Século passado. MIOPIA EM MARKETING Theodore Levitt - Best of HBR: 1960, Reprint R040L INTRODUÇÃO Theodore Levitt (1960) inicia seu famoso artigo dizendo que: Todo grande setor de atividade apresentou, em algum momento, uma rápida expansão. Mas alguns que atualmente cavalgam uma onda de crescimento com entusiasmo, estão de fato mais próximos das sombras do declínio. Outros que se consideram maduros e crescentes estão, na realidade, estagnados. Em todos os casos a razão pela qual o crescimento é ameaçado, retardado ou interrompido não é porque o mercado está saturado, mas sim porque ocorreu uma falha de gestão. Na seqüência, o autor passa a contextualizar o pensamento acima, classificando, discorrendo, caracterizando e exemplificando diversas situações, nas quais, em sua opinião e do ponto de vista estratégico de marketing e de negócios, as ações dos gestores foram equivocadas, mas que, por outro lado, contribuíram para a idéia, concepção, coleta de material e título do artigo em pauta sumarizado a seguir. Proposta equivocada De acordo com o autor, as diferenças de enfoque estratégico de marketing ou simplesmente da proposta da empresa, podem resultar no fracasso ou sucesso de uma organização, ou de todo um setor de atividades, alguns claramente evidentes, outros menos óbvios, conforme indicados e exemplificados abaixo: a) ferrovias - setor logístico de grande importância estratégica para qualquer país, que nos Estados Unidos, em particular, vivenciou “anos dourados”, mas que atualmente apresenta um declínio generalizado, por ter sido tratado isoladamente como setor ferroviário e não como um modal inserido em um contexto mais amplo como o da indústria de transporte; b) Hollywood - ameaçada por vídeos e outras mídias, foi posicionada como indústria cinematográfica ao invés de indústria de entretenimento, com sentido mais amplo; c) nylon e vidro - Du Pont e Corning Glass Works, respectivamente, com produtos, tecnologia e marcas amplamente conhecidas, que, além de disporem de produtos diferenciados e mesmo focalizando suas indiscutíveis competências e capacidades técnicas, não deixam de observar o que seus clientes e o mercado demandavam das mesmas. d) alumínio - material versátil, repositório de energia, com ciclo de logística reversa favorável e economicamente conveniente, mas que sem a visão e ação das empresas Kaiser Aluminium & Chemical Corp. e Reynolds Metal Co., não apresentaria o conhecimento, emprego, aplicações e demandas atuais. Análise equivocada As comparações entre os setores acima pode parecer indevida, pois ferrovias x alumínio apresentam características, versatilidade, aplicação, públicos e mercados certamente muito diferentes, todavia o autor argumenta que essa aparente disparidade reforça sua tese de que a visão focada no produto pode restringir a definição de uma estratégia ainda maior da empresa, provocando seu fracasso, completando dizendo que: “o que falta às estradas de ferro não é oportunidade, mas sim uma engenhosidade e uma gestão mais ousada que as engrandeçam” e finalizando citando Jacques Barzun em Trains and the Mind of Men (1961, p. 21), que corrobora os pensamentos anteriores: Entristece ver a mais avançada organização social e de recursos criada no século passado, mergulhada no envelhecimento e descrédito pela ausência da imaginação que a construiu. Falta às empresas (ferrovias - NA) a vontade de sobreviver e atender ao seu público com competência e criatividade. A SOMBRA DA OBSOLESCÊNCIA Vários se não todos os setores econômicos experimentaram de alguma forma e por algum momento, a síndrome do “setor de mais rápido crescimento”, processo este lastreado pela superioridade técnica de seus produtos, considerada insuperável e inabalável. O autor apresenta diversos exemplos que ilustram essa falha de percepção da realidade, a saber: a) lavagem a seco: processo desenvolvido para a limpeza de peças de vestuário confeccionadas com lã, mas que caiu em desuso com o desenvolvimento de produtos químicos alternativos para a lavagem da lã, de forma mais eficiente e barata, ou pela substituição dos próprios tecidos por fibras sintéticas mais leves, mais fáceis de cuidar e que não requerem tratamentos especiais; b) aparelhos elétricos: desnecessário discorrer sobre a substituição da iluminação a querosene por gás, posteriormente pela lâmpada incandescente, seguida pela de descarga elétrica em meio gasoso, até os dispositivos atuais: Light Emitting Diodes - LED’s e Organic Light Emitting Diodes - OLED’s. Assim como da roda d’água, pela máquina a vapor e esta pelos motores elétricos, com maior simplicidade, versatilidade e eficiência. A própria geração e distribuição da energia elétrica esta sendo contraposta por tecnologias alternativas tais como: nuclear, química, eólica, solar e outras que estão por vir. c) mercearias: substituídas pelas grandes cadeias de supermercados, devido ao poder de compra sobre fornecedores, assim como oferta de valores e outras facilidades apresentadas aos clientes por essa nova modalidade de varejo de produtos de consumo doméstico e pessoal, associada ao descrédito de proprietários de antigos pequenos negócios de esquina que não visualizaram a força e importância do novo modelo de negócios e acreditaram que seus clientes continuariam dando valor à antiga forma de fazer compras: “os poucos pequenos comerciantes que sobreviveram a esse processo de modernização mantiveram o orgulho, mas perderam a camisa”. d) falsa crença: acreditar que algo não mudará com o passar dos tempos é desacreditar na força e poder transformador galopante dos novos messias gêmeos: a química e a eletrônica, que em outras palavras significa investir em uma nova fábrica de lâmpadas incandescentes, quando alternativas mais eficientes, que apresentam vida mais longa, com menor consumo já são conhecidas e estão disponíveis no mercado1. De acordo com o autor, existem quatro condições para que um ciclo equivocado de crenças se manifeste, instale e provoque o desastre de uma operação, a saber: a) a crença de que o crescimento está assegurado pela expansão e afluência da população; b) a crença de que não existem substitutos competitivos para os produtos das grandes empresas; c) a crença no aumento da produção em massa e do surgimento de um “circulo virtuoso” provocando reduções de preço como conseqüência do aumento de volume; d) a crença em produtos que demandem experimentos científicos controlados especiais, melhorias ou reduções de custo de produção. O autor segue discorrendo e exemplificando diversas situações, todavia com mais ênfase para a indústria do petróleo que simplesmente sintetizaremos, acrescentando vez por outra, algum comentário relevante, tal como descrito na nota abaixo, de forma a complementar e atualizar as constatações originais. O MITO DA POPULAÇÃO A crença de que os lucros e crescimento estão assegurados pela expansão da população e conseqüente maior afluência de consumidores é, em outras palavras o “ente querido” que está presente no “coração” de qualquer organização. De fato, se a população cresce e a demanda dos produtos à acompanha, esse situação pode gerar um estado de conforto, segurança e ausência aparente de problemas que, para serem resolvidos, exigem o desenvolvimento de novas soluções. A ausência de problemas pode levar à estagnação. _____________________ 1 - NA: adicionamos a citação de tecnologias mais recentes com o objetivo de reforçar a idéia original de Levitt. Segundo o autor, a aparente falta de problemas em um setor ou empresa, pode levar a uma situação de conforto, que provoca um estado de torpor, reduzindo o pensamento, estado de alerta e as capacidades de percepção das ações da concorrência. Assim, não existe uma situação estável e confortável, mas sim um ambiente dinâmico, sujeito a variações imprevisíveis, frente às quais a manutenção de uma atitude pró-ativa, sem descuidar da capacidade de percepção das mudanças tênues ou radicais diuturnas, como também da competência para disparar mecanismos de ações reativos ou alternativos, de forma imediata, a fim de reduzir, neutralizar, ou idealmente superar as expectativas das novas demandas. O autor continua discorrendo sobre situações particulares da indústria do petróleo, tecendo considerações e observações absolutamente pertinentes, sendo oportuno lembrar que essas observações foram elaboradas antes da ocorrência da seqüência de crises mundiais originadas por esse setor de atividade econômica, que, por sua vez, reforçam os conceitos e as idéias apresentadas pelo citado.
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